O Efeito Translativo no Recurso: Uma Análise nos Embargos de Declaração, Recurso Especial e Extraordinário
O sistema jurídico brasileiro é complexo e dinâmico, repleto de nuances que exigem constante atenção e análise por parte dos operadores do direito. Dentro desse contexto, o efeito translativo no recurso torna-se um tema relevante, especialmente quando se trata de recursos de fundamentação vinculada, como os embargos de declaração, recurso especial e extraordinário.
Nos embargos de declaração, recurso utilizado para esclarecer obscuridades, suprir omissões ou corrigir contradições nas decisões judiciais, o efeito translativo é amplamente aceito na doutrina e consolidado na jurisprudência. Isso significa que, mesmo sendo necessário alegar matérias expressas na legislação para o trânsito do recurso, a análise pode se estender a outros pontos relevantes que não foram expressamente mencionados.
Entretanto, ao analisarmos o recurso especial, constatamos uma abordagem mais cautelosa por parte do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Após ultrapassar o juízo de admissibilidade e cabimento do recurso, a jurisprudência tem mitigado a aplicação do efeito translativo. Essa mudança de postura decorre do entendimento consolidado de que a matéria de ordem pública deve estar prequestionada, conforme estabelecido pelo art. 105, III, da Constituição.
O dispositivo constitucional mencionado estabelece que o recurso especial só pode ser utilizado para julgar causas decididas. Portanto, se a matéria de ordem pública não foi objeto de decisão pelo Tribunal a quo, o STJ não poderia apreciá-la. Essa limitação visa assegurar a observância do devido processo legal e o respeito ao contraditório, garantindo que as partes tenham oportunidade de se manifestar sobre todos os pontos relevantes da demanda.
O Código de Processo Civil brasileiro, em seus artigos 1.013, §3º, e 10, traz disposições importantes sobre a fundamentação das decisões judiciais. O tribunal não está adstrito ao fundamento determinante da decisão recorrida, podendo fundamentar sua decisão em qualquer motivo constante nos autos, mesmo que não tenha sido invocado pelas partes. No entanto, o juiz não pode decidir com base em fundamento sobre o qual as partes não tiveram oportunidade de se manifestar.
Dessa forma, a possibilidade de o tribunal examinar de ofício matérias não abordadas no recurso, desde que sejam de ordem pública, encontra respaldo legal, mas deve ser exercida com prudência e respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
Ademais, é importante ressaltar que, em termos práticos, os recursos não impedem a eficácia da decisão recorrida, exceto se houver disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso. A suspensão da eficácia da decisão pode ocorrer por decisão do relator, quando há risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e é demonstrada a probabilidade de provimento do recurso, conforme estabelece o parágrafo único do art. 995 do Código de Processo Civil.
Em conclusão, o efeito translativo no recurso revela-se como um instrumento jurídico complexo, cuja aplicação varia de acordo com o tipo de recurso em análise. Enquanto nos embargos de declaração sua aceitação é praticamente unânime, no recurso especial, a jurisprudência tem adotado uma abordagem mais restritiva, exigindo o prequestionamento da matéria de ordem pública para sua apreciação. Essa dinâmica evidencia a constante busca por equilíbrio entre a celeridade processual e a garantia dos direitos fundamentais no sistema jurídico brasileiro.
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